quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Da Série: Quando as Luzes Se Apagam. Pesadelo 01

Era uma noite comum. Lá fora não ventava e céu abdicara de suas estrelas. Ela encarava a cama, em pé ao seu lado, apática. Não havia resquício de qualquer expressão em seu rosto. Tentava ignorar o silêncio que impregnava o quarto enquanto deitava na cama e se cobria com o cobertor. Desligou a luz do abajur e não fez questão de procurar conforto ao recostar no travesseiro. Manteve os olhos abertos por um tempo, encarando o nada, depois, o teto, quando sua visão começou a aceitar a escuridão. 

Pensou ter piscado, mas na verdade adormeceu. A respiração leve quase não fazia som, mas estava longe de ser calma. Respirava fundo, pausadamente, quando sentiu a cama consumindo-a. O peso do seu corpo aparentava ter no mínimo triplicado. Ela sedia enquanto a cama a engolia. Levou certo tempo até que o desespero asfixiante se instalasse e quando surgiu já era tarde demais. A sensação claustrofóbica e macia dos lençóis, do travesseiro e do colchão ao redor de todo o seu corpo, puxando-a para baixo, não permitia qualquer movimento. O único sinal aparente de seu medo eram os olhos abertos ao seu máximo, as pupilas se movimentando desesperadamente de um lado a outro procurando por... Sem tempo de descobrir, subitamente os olhos se fecharam.

Despertou achando ter desmaiado. Sua cabeça doía, mas quando tentou tocar a testa percebeu que suas mãos estavam amarradas, foi quando se deu conta de tudo ao seu redor. Havia uma árvore. Seca. Morta. Seus galhos grossos iam-se afinando em pontas, que a lembrava garras extremamente afiadas, a medida que chegavam ao fim. Ela estava firmemente amarrada a eles a, pelo menos, um metro do chão, que estava coberto por uma fina neblina cinza, uma fumaça que envenenava o solo e retirava qualquer vitalidade dele. Tocá-la a mataria, ela tinha certeza disso. Olhando ao redor percebeu que a única luz presente fazia um círculo perfeito ao seu redor, focando ela e a árvore, e tudo fora desse círculo era pura escuridão. A mesma névoa que cobria o chão se alastrava livremente fora do círculo iluminado, não permitindo que nada sobrevivesse. 

Foi quando ouviu um ruído vindo da escuridão a sua esquerda e virou rapidamente na direção do som. Ouviu novamente agora do lado direito. Mais um vez. Parecia um estalo, como um galho seco quebrando. O som vinha de todos os lados, se aproximando lentamente, traiçoeiramente. Vários estalos simultâneos engoliam o silêncio surdo que parecia fazer parte do ambiente pesado. Ela temia pelo que poderia surgir da escuridão, seu coração batia em ritmo acelerado e som dos batimentos competiam com o som dos estalos em seus ouvidos. 

Algo alcançou o campo iluminado e ela viu o que poderia ser chamado de braço. Outro. Agora à direita. Mais outro à frente. Aos poucos. pequenos corpos foram surgindo, recobertos por carne putrefata, com braços desproporcionalmente grandes e dedos alongados com garras que lembravam os galhos da árvore. Os olhos esbugalhados, as pupilas, delineadas por uma fina linha cinza quase imperceptível, eram completamente brancas. A saliva escorria e espumava por presas podres e sujas. O fedor que emanavam era insuportável e ardia-lhe as narinas. Eles se locomoviam ora se arrastando com os braços, ora usando-os para saltar. Ora cravavam as garras no chão, ora levantavam os braços no ar, com as mãos pendendo para os lados. 

Os olhos dela lacrimejavam, ela chorava sem perceber, em total pânico, em total desordem mental. As criaturas se aproximavam ansiosas dela e, a cada movimento, um estalo. Todas as articulações pareciam engrenagens defeituosas que estalavam quando se moviam, principalmente os ombros. Cada osso do corpo parecia estar quebrado e se deslocavam constantemente sob a pele, perfurando-a de dentro para fora aqui e ali. 

Dezenas e dezenas se reuniam ao seu redor encarando-a com satisfação. Sem perder tempo, assim que chegaram a distância suficiente pularam e enterraram suas garras nas pernas dela, descendo até os pés, abrindo sua pele em cortes profundos. Amontoavam-se ao seu redor, pulando uns por cima dos outros, agitados. Os galhos em que ela estava presa sacudiam ferozmente enquanto eles dilaceravam suas pernas até os seus ossos. 

Gritos e mais gritos de pânico irrompiam de sua garganta. O desespero, a dor, o medo, um sobrepondo o outro sem pedir licença. Seus gritos cortavam suas cordas vocais na mesma intensidade dos cortes em suas pernas. O sangue esguichava sobre as criaturas amontoadas embaixo, que se deliciavam com o banquete fresco. Um pé fora arrancado, o outro pendia. Seus ossos aparentes, sua carne destroçada, seu corpo sem vida... Sua cama encharcada de suor. Havia decidido. Não dormiria outra noite. 

2 comentários:

  1. Posso dizer uma coisa com o risco de soar insistente? Você devia escrever mais. Sério, esse conto ficou ótimo. Você tem um bom ouvido pra formar frases, todas elas tem esse ritmo poético que, mesmo descrevendo um pesadelo horrível, são agradáveis de ler, são musicais quase. Sem exagero. Só pra mostrar que sou honesto, no começo tem uns erros de digitação, o que indica que você estava meio dormindo quando escreveu isso e escreveu tudo de uma vez. Pesadelo real esse descrito? Fora isso, acho até que você está melhorando desde as últimas vezes. Eu costumava te achar apressada na escrita, mas esse, apesar de curto, tem o tamanho exato. Pena que agora são mais...quatro meses até o próximo?
    E antes que eu esqueça, quando você vai aparecer de novo no skype/facebook para conversarmos de novo? Dessa vez você sumiu mesmo.

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    1. Poxa, minha vida está uma loucura! Estou sem tempo pra escrever e quando tenho quero dormir. Mas estou trabalhando no próximo conto exatamente agora. Serão todos pesadelos reais.
      Estou tentando voltar a ativa aqui, mas confesso que não estou me esforçando ao máximo... Obrigada pelos elogios, vou corrigir os erros, realmente fui escrevendo direto e nem fiz revisão direito. Acho que o próximo conto vai ficar menor, mas porque a história é menor mesmo.
      Enfim, obrigada de verdade, como só você comenta aqui, eu gosto muito quando você opina.
      Desculpa o sumiço (acho que você não aguenta mais eu dizendo isso).

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